02/09/2016

STF, entre a lei e a política

Eliane Cantanhêde
Até ontem já eram nove mandados de segurança mirando na votação do Senado. Para os aliados de Dilma, não houve caracterização de crimes de responsabilidade. Para os adversários, é uma aberração jurídica votar, primeiro, metade de um parágrafo do artigo 52 da Constituição e, depois, a outra metade.
Esse parágrafo refere-se à “perda do cargo, COM inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública”. Porém, o presidente do Supremo, Ricardo Lewandowski, permitiu e o plenário do Senado votou a “perda do cargo” e, em seguida, a “inabilitação”. Assim, criou-se uma excrescência e, pior, um precedente perigoso: a presidente foi cassada, mas SEM inabilitação para ocupar qualquer cargo público.
Para o decano do Supremo, Celso de Mello, uma coisa (inabilitação) é “efeito natural” da outra (perda de mandato), e não haveria possibilidade de votação autônoma. Para o ministro Gilmar Mendes, a solução “foi bizarra e não passa nem no jardim de infância do Direito”. Se não passa nem no jardim de infância, passará no Supremo?

Há duas opções, basicamente, para a alta Corte: ou julga politicamente, lava as mãos e decide que o Senado era o juiz e poderia fazer o fatiamento; ou julga tecnicamente, segue a “letra fria da lei” e conclui que um mero destaque em plenário não pode se contrapor ao que diz a Constituição. Neste último caso, o julgamento final teria de ser refeito e ficaria uma dúvida: Temer voltaria a ser interino e Dilma a ser só “afastada”? Seria um pandemônio – senão uma palhaçada.
Do ponto de vista técnico, jurídico, os especialistas não veem alternativa para o Supremo que não a anulação da votação e do fatiamento de uma mesma frase, de um mesmo parágrafo, de um mesmo artigo, de uma mesma Constituição, para favorecer casuisticamente Dilma Rousseff. Condenando a presidente da República por crime de responsabilidade, mas inocentando a cidadã.
A sensação generalizada é que o fatiamento foi uma trama do PT com uma parte do PMDB, passando por três personagens: o ex-presidente Lula, o presidente do Senado, Renan Calheiros, e Lewandowski, que, apesar de todos terem sido surpreendidos pelo destaque do PT, fez um longo discurso para alegar que ele não era juiz, os juízes eram os senadores. De tão longo, pareceu previamente elaborado.
Assim, Lewandowski decidiu monocraticamente acatar o destaque e autorizar que os senadores votassem o mérito, em separado, das duas penas impostas a Dilma. Já que os senadores eram os juízes, ele não deveria ter levado o acatamento ou não do destaque ao plenário, para só então abrir a votação do mérito? Grande dúvida em Brasília: teria sido convencido por Lula

Nenhum comentário:

Postar um comentário

SUA POSTAGEM SERÁ PUBLICADA DEPOIS DE SER MODERADA. OBRIGADO!

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.