10/01/2012

SENTENÇA PROCESSO DOS QUATRO VEREADORES E PREFEITO SARANDI‏

Processo 703279-1 Apelação Cível

Data 01/04/2011 18:25 - Disponibilização de Acórdão

Tipo Acórdão

APELAÇÃO CÍVEL Nº 703279-1, DA COMARCA DE SARANDI - VARA CÍVEL E ANEXOS APELANTE 1 : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ APELANTE 2 : CLAUDIONEI APARECIDO VITORINO DA SILVA E OUTRO APELADO 1 : RAFAEL PSZYBYLSKI E OUTROS APELADO 2 : L MENEGATTI & CIA LTDA E OUTROS INTERESSADO : MUNICÍPIO DE SARANDI RELATORA : DES.ª MARIA APARECIDA BLANCO DE LIMA

APELAÇÕES CÍVEIS. DIREITO CONSTITUCIONAL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA MOVIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO CONTRA OS VEREADORES DE SARANDI E PESSOA JURÍDICA JUNTAMENTE COM SEUS SÓCIOS. ATOS ÍMPROBOS RELATIVOS À ALTERAÇÃO DE LEI COMPLEMENTAR POR LEI ORDINÁRIA COM O FIM DE BENEFICIAR PESSOA ÚNICA E DETERMINADA. SENTENÇA QUE JULGA PARCIALMENTE PROCEDENTE O PLEITO INICIAL. RECURSOS DE AMBAS AS PARTES. EXAME DE ADMISSIBILIDADE. RECURSO DE APELAÇÃO DESERTO E RECURSO ADEVISO MACULADO DE PRECLUSÃO CONSUMATIVA E INTEMPESTIVIDADE NÃO RECEBIDOS EM PRIMEIRO GRAU. IMPOSSIBILIDADE DE CONHECIMENTO POR ESTA CORTE DE JUSTIÇA. RECURSO DE APELAÇÃO INTERPOSTO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO PLEITEANDO A CONDENAÇÃO, NA FORMA DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINSITRATIVA, DA EMPRESA E DOS SÓCIOS. RECURSO DE APELAÇÃO DE DOIS OUTROS REQUERIDOS ALEGANDO A INOCORRÊNCIA DE ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. QUESTÃO PREJUDICIAL. ALEGADA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA QUE ENVOLVE A EDIÇÃO DE LEGISLAÇÃO (LEI MUNICIPAL N.º 1231/2005 E LEI COMPLEMENTAR N.º 131/2006) PRIVILEGIANDO UMA ÚNICA EMPRESA PARTICULAR, EM CONTRARIEDADE À LEI COMPLEMENTAR N.º 71/2001, QUE VEDA A INSTALAÇÃO DE POSTOS DE ABASTECIMENTO DE VEÍCULOS NUM RAIO MÍNIMO DE 500 M DE UM POSTO PARA OUTRO). LEGISLAÇÃO QUE EVIDENCIA OFENSA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS, EM ESPECIAL AO DA IMPESSOALIDADE. NECESSIDADE DE PRÉVIA MANIFESTAÇÃO DO ÓRGÃO ESPECIAL SOBRE O TEMA, PARA POSTERIOR JULGAMENTO ACERCA DA IMPROBIDADE. SUSPENSÃO DO JULGAMENTO. INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 97 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 112 DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL E 270 DO REGIMENTO INTERNO DO TJPR. SUSPENSÃO DO JULGAMENTO. REMESSA DOS AUTOS AO ÓRGÃO ESPECIAL.

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 703279-1, Comarca de Sarandi - Vara Cível e Anexos, em que são apelantes MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ e CLAUDIONEI APARECIDO VITORINO DA SILVA e OUTRO, sendo apelados RAFAEL PSZYBYLSKI E OUTROS e L MENEGATTI e OUTROS, figurando como interessado o Município de Sarandi.

Tratam-se de recursos de apelação cível, sendo o primeiro interposto pelo Ministério Público do Estado do Paraná; o segundo, por Rafael Pszybylski, Antonio da Cunha, João de Lara Vieira, Carlos Alberto de Paula Junior, Luiz Carlos de Aguiar e Belmiro da Silva Farias e, o terceiro, por Claudionei Aparecido Vitorino da Silva e Celiton Damasceno do Carmo, todos voltados contra a r. sentença proferida às fls. 527/534-TJ dos autos n.º 288/07 de ação de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público contra L. Menegatti & Cia. Ltda. e Outros, que julgou improcedente o pedido inicial em relação aos réus L. Menegatti & Cia. Ltda, Valmor Menegatti, Marines Osmarin Menegatti e Letícia Menegatti, e julgou procedente a pretensão articulada em relação aos demais réus, Antonio da Cunha, Rafael Pszyblski, Claudionei Vitorino, João de Lara, Carlos de Paula, Belmiro da Silva, Luiz Aguiar, Valdir da Silva e Cleiton Damasceno, impondo a estes a) o pagamento de multa equivalente a 10 vezes a remuneração percebida na época (para cada um), corrigida pelo INPC e b) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 03 anos.

Diante da sucumbência recíproca, condenou os requeridos Antonio da Cunha, Rafael Pszybylkski, Claudionei Vitorino, João Lara, Carlos de Paula, Belmiro da Silva, Luiz Aguiar, Valdir da Silva e Cleiton Damasceno ao pagamento solidário de 50% das custas processuais e dos honorários em favor do Fundo Especial do Ministério Público, que foram arbitrados em R$ 2.500,00, corrigíveis a partir desta data pelo INPC.

Em suas razões recursais1, o Representante do Ministério Público de 1º Grau afirma que diante do quadro probatório constante dos autos, revela-se que a empresa L. Menegatti & Cia. Ltda, Valmor Menegatti, Marines Osmarin Menegatti e Letícia Menegatti concorreram para a prática do ato de improbidade, razão pela qual pretende a reversão do julgamento na parte que julgou improcedente o pedido, pugnando pela condenação das pessoas mencionadas. Informa que os representantes da empresa mantiveram contato com os Vereadores a fim de que viabilizassem uma solução voltada aos interesses comerciais da empresa jurídica em questão, e não uma. 1 Fls. 536/548. Ateração legislativa que colhesse as regras jurídicas a toda a coletividade.

Alude que a Lei Municipal n.º 1.231/05 menciona o empreendimento da citada empresa de maneira detalhada, e do que se depreende, que a procura pelo auxílio dos vereadores deu-se de forma consciente para obtenção do texto legal específico.

Ao final, pugna pela reforma da sentença, para fins de que se reconheçam os apelados L. Menegatti & Cia. Ltda, Valmor Menegatti, Marines Osmarin Menegatti e Letícia Menegatti como incursos nas sanções do artigo 11, caput da Lei n.º 8.429/92.

O recurso foi recebido em seu duplo efeito.2 Devidamente intimados, os apelados ofereceram contrarrazões3, postulando a manutenção da sentença e o desprovimento do recurso.

Os segundos Apelantes (Rafael Pszybylski, Antonio da Cunha, João de Lara Vieira, Valdir da Silva, Carlos Alberto de Paula Junior, Luiz Carlos de Aguiar e Belmiro da Silva Farias) também recorreram4, anexando entendimentos jurisprudenciais5. Nas razões recursais, sustentam que em todos os documentos e manifestações constantes do processo, em nenhum momento foi sugerido que os apelantes tivessem obtido algum tipo de vantagem pessoal ou colaborado para vantagem ilícita por terceiros. Também, alegam que não houve qualquer prejuízo ao Erário, pois com a vinda das empresas surgiram novas receitas advindas de tributos próprios, tais como ISS, 2 Fls. 549. 3 Fls. 612/628. 4 Fls. 551/572. 5 Fls. 573/587. IPTU e ITBI), além de outros tributos compartilhados.

Argumentam que na ocasião dos projetos havia uma proposta concreta de construção de um Posto de Combustíveis em um determinado terreno baldio de Sarandi; os empresários pretendentes haviam adquirido o imóvel e providenciado toda a documentação necessária; ao solicitarem o alvará de localização e funcionamento, foram informados da existência de uma Lei Municipal que exigia uma distância de 500m entre um posto e outro; surpresos com a notícia, eles se dirigiram à Câmara Municipal em busca de solução para o caso; o Presidente desta, ao analisar os fatos, discutiu com os demais vereadores e apresentou um projeto de lei e o submeteu às Comissões Permanentes da Câmara e à Assessoria Jurídica, o qual foi aprovado, autorizando-se a instalação da empresa no citado terreno.

Dentre outras considerações, alegam inexistir ato ímprobo, má-fé ou prejuízos ao erário e muito menos enriquecimento ilícito, eis que os vereadores são invioláveis em relação às suas opiniões e aplicaram todos os procedimentos legais exigidos para o trâmite e aprovação dos projetos de leis. Ainda, rediscutiram o assunto, editando a Lei Complementar n.º 138/06, que fixou novos limites para a instalação de postos de combustíveis em Sarandi e estendeu o direito concedido anteriormente a novos interessados.

Votaram com convicção de que estariam proporcionando geração de empregos e a movimentação de riquezas no Município e invocam o princípio da inocência.

Ao final, pugnam pela reforma integral da sentença com a declaração de inexistência de improbidade administrativa e a declaração da imunidade material dos apelantes pela liberdade constitucional do voto que o detentor do cargo de vereador possui, em defesa da segurança institucional.
 
Tanto a apelação como o recurso adesivo à apelação do Ministério Público, interpostos por Rafael Pszybylski e outros não foram recebidos. A primeira, por falta de preparo6 e o segundo, por sua intempestividade7, dentre outros fundamentos.

A douta Procuradoria de Justiça manifestou-se8 pelo conhecimento e o provimento parcial do recurso de apelação interposto pela 1ª Promotoria de Justiça da Comarca de Sarandi e pelo conhecimento e o desprovimento do recurso de apelação cível manejado por Claudionei Aparecido Vitorino da Silva e Cleiton Damasceno do Carmo.

É o relatório.

Voto.

Inicialmente, como mencionado em relatório, o não recebimento da apelação interposta por Rafael Pszybylski e outros 9 fundamentou-se na ausência de preparo, uma vez que o apelo não se fez acompanhar do comprovante de recolhimento dos portes de remessa e retorno, na forma exigida pelo artigo 511 do CPC.

O aludido dispositivo estabelece que no ato de interposição do recurso o recorrente comprovará, quando exigido pela 6 Fls. 635.  Fls. 709 e verso. 8 Fls. 772/798. 9 Fls. 635. legislação pertinente, o respectivo preparo, inclusive porte de remessa e de retorno, sob pena de deserção.

No caso dos autos, contudo, a parte não efetuou o devido preparo e apenas dois meses após a protocolização da apelação é que requereu a concessão do benefício da justiça gratuita, pretendendo, pois, a isenção retroativa do pagamento devido.

Correta, portanto, a consideração do magistrado singular ao destacar que o apelo "não veio acompanhado do comprovante de recolhimento dos portes de remessa e retorno", razão porque não poderia ser recebido.

A propósito da questão, tratando de recorrente não beneficiário de assistência judiciária e que, ainda assim, deixa de proceder ao devido preparo, o Tribunal de Justiça de Goiás já decidiu:

APELAÇÃO CÍVEL - EXECUÇÃO DE TÍTULOS EXTRAJUDICIAIS - PESSOA JURÍDICA - ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA NÃO CONCEDIDA NA INSTÂNCIA SINGELA - PEDIDO FEITO NO JUÍZO AD QUEM - INDEFERIMENTO - PROVA DA INSUFICIÊNCIA DE RECURSOS NÃO DEMONSTRADA - AUSÊNCIA DE PREPARO RECURSAL NO PRAZO DA LEI - DESERÇÃO - (...) II. O preparo recursal, no momento da interposição do recurso, constitui condição de admissibilidade do apelo, nos termos do artigo 511, do código de processo civil. Se a recorrente não está assistida pelos benefícios da assistência judiciária, e seu dever proceder o devido preparo, pois se assim não faz, e caso de não conhecimento do recurso de apelação, ante a presunção de deserção. Apelação não conhecida. (TJGO - AC 75284- 2/188 - (200400028160) - 3ª C.Cív. - Rel. Des. Nelma Branco Ferreira Perilo - J. 19.09.2005) (grifo nosso)

Sendo assim, não tendo sido recebido o recurso já em primeiro grau ante a deserção, quanto a ele descabe o exame por esta Corte de Justiça no presente momento.

Relativamente ao recurso adesivo manejado por Rafael Pszybylski e outros novamente, o não recebimento residiu em três razões, sintetizadas pelo Juiz de Direito da Comarca de Sarandi da seguinte forma:

"deixo de receber o apelo adesivo de fls. 638/653, primeiramente porque o recurso principal foi manejado pelo Ministério Público, contra a parte da sentença que julgou improcedente a pretensão em relação a outros réus (que não os apelantes adesivos). Em segundo lugar, os mesmos apelantes adesivos já haviam apresentado, antes, uma apelação própria, a qual foi julgada deserta pela decisão de fl. 635. Por fim, ainda que cabível fosse o apelo adesivo na hipótese, certo é que foi apresentado completamente fora do prazo, que teve início em 15.03.2010, pois do teor do despacho de fls. 549 também foi intimado o Dr. Jônias de O. e Silva (procurador dos apelantes adesivos), como se verifica na certidão de fl. 588. O recurso adesivo, por sua vez, foi encaminhado por fax a este Juízo somente em 27.04.2010." (grifo nosso)

Notadamente, seja pela preclusão consumativa, seja pela intempestividade, o não recebimento do recurso adesivo interposto era medida que se impunha no caso concreto.

Em sentido semelhante, vale ressaltar o seguinte precedente da Corte Superior:

PROCESSUAL CIVIL - RECURSO ESPECIAL - RECURSOS AUTÔNOMO E ADESIVO INTERPOSTOS PELA MESMA PARTE - ART. 500, DO CPC - PRECLUSÃO CONSUMATIVA (...). 3. O recurso adesivo é inadmissível pela parte que já interpusera apelo autônomo, ainda que não conhecido, ante a ocorrência de preclusão consumativa. (...) (STJ - RESP 200500546149 - (739632 RS) - 1ª T. - Rel. Min. Luiz Fux - DJU 11.06.2007 - p. 00268) (grifo nosso) Disso resulta, novamente, que não cabe a esta Corte de Justiça o exame do recurso adesivo em questão.

Superadas essas questões e uma vez satisfeitos os pressupostos processuais de admissibilidade, conheço da apelação interposta pelo Ministério Público bem como da apelação interposta por Claudionei Aparecido Vitorino da Silva e Cleiton Damasceno do Carmo, as quais passam a ser examinadas.

Apelações do Ministério Público autor e dos réus: Prejudicial - Incidente de Inconstitucionalidade:

Ambas as partes interpõem recurso contra a sentença10 que julgou improcedente a pretensão articulada em ação de improbidade administrativa em relação aos requeridos L. Menegatti & Cia Ltda, Valmor Menegatti, Marines Osmarin Menegatti e Letícia Menegatti e procedente quanto aos requeridos Antônio da Cunha, Rafael Pszybylski, Claudionei Vitorino, João Lara, Carlos de Paula, Belmiro da Silva, Luiz Aguiar, Valdir da Silva e Cleiton Damasceno, impondo a estes o pagamento de multa equivalente a 10 vezes a remuneração percebida na época (para cada um) e suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 03 anos.

Extrai-se dos autos que, em 19/10/05, L. Menegatti & Cia LTDA adquiriu o lote de terras n.º 262-C em Sarandi pretendendo a instalação 10 Fls. 527/534. de um posto de combustíveis. Entretanto, ao solicitar a respectiva autorização para edificação foi informado que a Lei Complementar n.º 71/01 impede a instalação de um posto em distância inferior a 500m de outro posto e, no caso concreto, já havia um a menos de 300m do imóvel adquirido.

Seguindo com o intento de instalação, um representante da empresa L. Menegatti procurou o Vereador Antônio Cunha para que esse viabilizasse uma solução para o caso. Por essa razão, em 03/11/05 a Mesa Diretora da Câmara dos Vereadores apresentou para votação o Projeto da Lei Ordinária n.º 1.363/05 propondo autorizar a Secretaria Municipal de Urbanismo a agilizar os procedimentos que competem à Administração Municipal e liberar excepcionalmente a construção e as instalações do posto naquele local.

Mais tarde, em 01/12/05 o projeto foi aprovado por unanimidade e veio a se converter na Lei Ordinária n.º 1.231/05 e o posto foi efetivamente instalado.

Inconformado com o ocorrido, o Ministério Público do Estado do Paraná propôs Ação de Improbidade Administrativa contra a empresa L. Menegatti e Cia LTDA e seus sócios bem como em relação aos integrantes da Câmara Municipal que aprovaram as leis em questão, requerendo a condenação dos mesmos à perda das funções públicas eventualmente exercidas à época da decisão de mérito, a suspensão de seus direitos políticos, o pagamento de multa e a proibição de contratar com o Poder Público.

Em sentença, o magistrado a quo julgou improcedente a pretensão articulada em relação aos requeridos L. Menegatti & Cia Ltda, Valmor Menegatti, Marines Osmarin Menegatti e Letícia Menegatti, mas procedente em relação aos requeridos Antônio da Cunha, Rafael Pszybylski, Claudionei Vitorino, João Lara, Carlos de Paula, Belmiro da Silva, Luiz Aguiar, Valdir da Silva e Cleiton Damasceno, impondo-lhes o pagamento de multa equivalente a 10 vezes a remuneração percebida na época (para cada um) e suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 03 anos.

Irresignado com o trecho da sentença em que o Juiz a quo considerou improcedente o pedido constante da inicial, o Ministério Público apelou asseverando que todos os requeridos devem ser responsabilizados porque as circunstâncias diante das quais os fatos ocorreram revelam que o contrato entre o(s) representante(s) da empresa e os Vereadores se deu a fim de que se viabilizasse uma solução (simulacro) voltada aos interesses específicos da pessoa jurídica em questão, não se tratando de uma simples alteração legislativa voltada para toda a coletividade.

Por sua vez, o apelo dos réus recorrentes defende a legalidade dos atos normativos municipais por eles editados, que fixaram novos parâmetros para a instalação de postos de combustíveis em Sarandi e, por consequência, refuta a prática de ato de improbidade administrativa.

Antes de tudo impõem-se alguns comentários sobre quanto à competência legislativa para tratar da revenda de combustíveis.

A competência para a disciplina do funcionamento de revenda de combustíveis é da União, pois acerca desse assunto o interesse nacional prepondera sobre o interesse local (art. 238 da CF/88). Assim, embora caiba à União a disciplina das normas gerais, como essa matéria também é de interesse local, o Município detém competência legislativa suplementar (art. 30, incisos I e II, da CF/88).

A esse respeito, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em voto de relatoria do eminente Des. Araken de Assis, posicionou-se do mesmo modo:

CONSTITUCIONAL CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE - LEI LOCAL DISCIPLINANDO O FUNCIONAMENTO DE POSTOS DE REVENDA DE COMBUSTÍVEIS - Predomínio do interesse nacional.

Competência legislativa suplementar do município. 1.

Compete a união, nos termos do art. 238 da CF/88, disciplinar o funcionamento de revenda de combustíveis, pois há predomínio de interesse nacional sobre o interesse local, neste assunto, e, assim, não há competência privativa do município ( CF/88, art. 30, I). No entanto, ao município cabe suplementar as leis da união, quando houver interesse local (CF/88, art. 30, II) (...). 2. Incidente de inconstitucionalidade rejeitado. (TJRS - INC 70000173237 - (00340103) - TP - Rel. Des. Araken de Assis - J. 22.11.1999 ) (grifo nosso)

Consistindo a fixação da distância entre os postos de revenda de combustíveis um assunto de interesse local, ao Município cabe essa competência legislativa, consoante inúmeros precedentes do Supremo Tribunal Federal dentre os quais se destaca:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONVERSÃO EM AGRAVO REGIMENTAL. CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA DO MUNICÍPIO PARA FIXAR A DISTÂNCIA ENTRE POSTOS DE REVENDA DE COMBUSTÍVEIS.

PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.

(RE 566836 ED, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 30/06/2009, DJe-152) (grifo nosso)

O distanciamento em questão, aliás, não constitui ofensa ao princípio da livre concorrência, mas, em verdade, existe com vistas à preservação do interesse público, bem como à salvaguarda da segurança da população e controle da poluição, consoante se observa no seguinte julgado no Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul:

APELAÇÃO CÍVEL - MANDADO DE SEGURANÇA - DISTÂNCIA ENTRE POSTOS DE REVENDA DE COMBUSTÍVEIS - DETERMINAÇÃO LEGAL - OFENSA AO PRINCÍPIO DA LIVRE CONCORRÊNCIA - INEXISTÊNCIA - RECURSO PROVIDO - O distanciamento entre postos de revenda de combustíveis estabelecida pelo item 13.3.1 do Decreto Estadual nº 5.672, de 22 de outubro de 1990, que regulamenta a Lei Estadual nº 1.092, de 6 de setembro de 1990, não cerceia o exercício da livre concorrência e da livre iniciativa, mas é aplicado para preservar o interesse público, salvaguardar a segurança da população, bem como controlar a poluição. (TJMS - ReexSen 2008.033370- 7/0000-00 - Amambai - 3ª T.Cív. - Rel. Des. Rubens Bergonzi Bossay - J. 25.05.2009)

No caso dos autos vislumbra-se que, exercendo sua competência legislativa suplementar, o Município de Sarandi editou a Lei Complementar n.º 71/01 a qual estabelece que o artigo 122 da Lei Complementar n.º 05/92 passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 122 - Fica proibida a instalação de Postos de Abastecimento de veículos num raio mínimo: I. 500 (quinhentos metros) de um posto para outro;"

A Lei Complementar Municipal n.º 71/01, por disciplinar o interesse local relativo ao distanciamento mínimo entre postos de abastecimento, consiste regular exercício da competência legislativa do Município de Sarandi, restando afastada, por isso, eventual inconstitucionalidade pertinente à atuação legislativa municipal em tal campo.

Feitas essas considerações, deflagra-se dos autos que toda a alegação do Ministério Público na inicial é relativa à alegada improbidade administrativa praticada pelos réus ao editarem outras duas normas jurídicas posteriormente que tratam da mesma matéria, em evidente ofensa ao princípio da impessoalidade, já que contrárias à disposição expressa no primeiro ato normativo constitucional (Lei Complementar 71/2001). O princípio da impessoalidade está previsto nos artigos 5º, caput, e 37, caput, ambos da Constituição Federal.

A primeira norma a que esta Quarta Câmara Cível se inclina pela declaração de inconstitucionalidade é a veiculada pela Lei Ordinária Municipal n.º 1231/05 - que autoriza a Secretaria Municipal de Urbanismo a agilizar os procedimentos que competiam à administração municipal e liberar excepcionalmente a construção e as instalações de um posto de serviços de veículos e dependências que compõe o projeto de engenharia, no lote de terras sob número 262-C-3 - posteriormente ratificada pela segunda norma que também parece inconstitucional, a Lei Complementar 131/0611, que acaba por criar uma arbitrária autorização excepcional e contrária à primeira Lei Complementar n.º 71/2001 (que proibia a instalação de postos de combustíveis num raio inferior a 500m de um posto para outro), tudo destinado a atender a pretensão de determinada pessoa jurídica de direito privado em se estabelecer no Município, em detrimento de outras que continuaram a se submeter às vedações legais da LC 71/201, evidenciando um dirigismo legislativo.

11 Lei Complementar esta que não só ratificava a Lei Ordinária n.º 1231/2005, mas ia alem e consignava em seu artigo 3.º que para "a aplicação específica desta Lei Complementar, ficam revogadas as disposições em contrário".

Com efeito, a atividade legislativa não é incontrastável.

Ao contrário, justamente por dever ter sua adequação aos comandos constitucionais sempre perquirida, é legítima a atuação do Poder Judiciário nesse sentido. Em vista disso, o legislador infraconstitucional deve render total obediência aos comandos estatuídos no texto constitucional sob pena de invalidade das normas que editar12.

Contudo, ao que parece, os atos normativos municipais citados - Lei Ordinária 1231/05, posteriormente ratificada pela Lei Complementar 131/06 - parecem ofender o dever de impessoalidade e moralidade, o que acaba por torná-la inconstitucional, diante do disposto no artigo 37 da Carta Magna.

Desta forma, direcionando-se a presente ação de improbidade administrativa ao ato de edição essas duas leis municipais, que sob o ponto de vista desta Quarta Câmara Cível parecem estar eivadas de inconstitucionalidade, porque se afastam de predicado próprio às normas jurídicas que é o da heteronímia - que é a indiferença para quem o seu comando é dirigido, no caso a autorização veiculada nos dois textos normativos são para atender a interesse da empresa Menegatti em se instalar em local certo e determinado, demonstrando, portanto, o caráter personalizado das normas, em ofensa aos artigos 5.º e 37, caput, CF - é indispensável a prévia manifestação do Órgão Especial sobre o tema, no intuito de extirpá-las do ordenamento jurídico por inconstitucionalidade, moldes do artigo 97 da Constituição da República, com reprodução obrigatória no artigo 112 da Constituição Estadual do Paraná, que assim dispõem:

12 GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade administrativa. 4ª ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 309.

"Artigo 97-CF - Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público"

"Artigo 112-CE - Somente pelo voto da maioria absoluta dos seus membros ou dos membros do órgão especial, poderá o Tribunal de Justiça declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público."

Por sua vez, o Regimento Interno deste Tribunal de Justiça, possui dispositivo semelhante:
 
"Art. 270. As Seções e as Câmaras, sempre que se inclinarem pela inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo, determinarão a remessa do processo ao Órgão Especial."

No intuito de dirimir qualquer controvérsia em relação à aplicabilidade do disposto no artigo 97 da Constituição Federal, o Supremo Tribunal Federal ainda editou a Súmula Vinculante nº 10 que, nos termos do artigo 103-A da Carta Magna, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário.

"Súmula Vinculante nº 10 - Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de Tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte."

Destaque-se inexistir julgamento decidindo pela inconstitucionalidade do referido dispositivo legal municipal pela Corte Especial deste Tribunal, o que torna impossível ao órgão fracionário a apreciação da matéria.

Desse modo, cumpre suspender o julgamento do presente Recurso de Apelação Cível e suscitar incidente de argüição de inconstitucionalidade da Lei Ordinária n.º 1231/2005 e da Lei Complementar n.º 131/2006, ambas do Município de Sarandi, por violação aos princípios constitucionais previstos nos artigos 5.º e 37, caput da Constituição Federal, devendo os autos ser remetidos ao Órgão Especial para os devidos fins, observado o que dispõe o artigo 270 e seguintes do Regimento Interno deste Tribunal, com as cautelas legais.

DECISÃO:

ACORDAM os Desembargadores integrantes da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em suspender o julgamento do processo, suscitando incidente de inconstitucionalidade das Leis Municipais, com a remessa dos autos ao Órgão Especial por reserva de plenário, com base no artigo 97 da Constituição Federal e 270 do Regimento Interno desta Corte de Justiça, nos termos do voto da Relatora.

Participaram da sessão e acompanharam o voto da Relatora os Excelentíssimos Senhores Desembargadores ABRAHAM LINCOLN CALIXTO, Presidente, sem voto, LUÍS CARLOS XAVIER e o Juiz Substituto em Segundo Grau FÁBIO ANDRÉ SANTOS MUNIZ.

Curitiba, 29 de março de 2011.

Des.ª MARIA APARECIDA BLANCO DE LIMA Relatora

9 comentários:

  1. Complicado ler assim.
    Não fiquei sabendo como ficou o caso Joaquinzão.
    O prefeito empossado vai ser cassado?
    os vereadores vão ser cassados?
    Vão ficar com os direitos politicos cassados por 03 anos?
    Me esclareça homi di Deus, em palavras simples.
    Estou curioso para saber.

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  2. Afinal de contas Joaquinzao eles sao ou nao sao culpados??????????????

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  3. Eita povo que gosta de cassassão... Saiba que a cidade perde com essas bagunças politicas, não tem que ter cassassão por causa de um posto de gasolina não, não tem e nem vai ter.

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  4. ACORDAM os Desembargadores integrantes da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em suspender o julgamento do processo,

    Acabou essa historia de posto juninho agora né?
    O posto tá lá, bonito, com prédios do lado, antes era puro mato. UFA

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  5. TEM UM MONTE DE BABA OVO AI QUE AINDA CANTA DE GALO... FORAM CAÇADOS SIM E ESTÃO IMPETRANDO UMA LIMINAR NO SUPREMO QUE SE NÃO ACATAR JA ERA. SARANDI SO PODE CAÇAR SE FOR O MILTON NÉ? SE FOR ESSE ARROGANTE QUE SO SABE FAZER ASFALTO E MAIS NADA NÃO PODE? SARANDI MERECE GENTE MELHOR PARA COMANDAR, GENTE COMPETENTE, NAO ESSE BANDO DE MERCENÁRIOS QUE SO ANDAM DE CARRÃO COM UM MONTE DE CC MAMANDO NA TETA.

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  6. E os panetones com ouro dentro Joaquinzão? O prefeito pagou 20 reais cada um sendo que custa menos de 6 nos mercados kkkkkk como são rápidos. Agora caçados quero ver o clima de ja ganhou.

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  7. Que anonimo BURRO. suspenderam o processo unanime. Mas o processo que os réus estavam querendo impetrar, ou seja, que a seria inconstitucional. Precisa ler mais anonimo antes de falar besteira.

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  8. GENTE! ELES FORAM CONDENADOS, MAS ESTÃO TENTANDO RECORRER EM BRASÍLIA NO SUPREMO. SE O SUPREMO ACEITAR ELES AINDA RESPIRAM ATE O JULGAMENTO SE NÃO ACEITAR ELES VÃO POR A VIOLA NO SACO E SAIR DE FININHO...

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  9. Após todos esse vergonhosos comentarios de falcatruas, super faturamento, dispença de licitação de uma quantia exorbitante eu acho que é mais um crime essa administraçaõ contiuar no poder se isso acontecer, daqui para a frente só vou votar em branco e nunca mais vou procurar a justiça terrena,; Só vou entregar na mão da justiça Divina.

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